Essa é a história do réveillon de 2011/2012 que passei em Koh Phi Phi na Tailândia. Coloquei apenas as iniciais de todos os envolvidos para não causar qualquer tipo de constrangimento. C. estava pesquisando num fórum de viajantes na internet, quem iria passar o réveillon na Tailândia e encontrou o meu nome e do M. Ela mandou e-mail para nós dois e começou a perguntar onde iríamos passar o réveillon e começamos uma amizade virtual.
Eu estava disposta a ir para Koh Panghan para a festa da full moon, porque já tinha escutado que a festa de Koh Phi Phi não era muito legal. Mas, como os dois queriam ir para Koh Phi Phi e eu já sabia que passaria o Natal sozinha, achei que seria legal passar o réveillon com dois brasileiros.
Mantivemos o contato virtual por semanas, reservamos um quarto triplo e combinamos de nos encontrar em Koh Phi Phi no dia 30 de dezembro. Como eu já estava há muito tempo viajando, eu nem me preocupei muito com o fato que podia ser que a gente não se desse bem, porque na minha cabeça, isso não iria acontecer. E caso acontecesse, a gente só iria dividir o mesmo quarto. Como eu já estava super acostumada a dividir quarto, estava bem desencanada quanto a isso.
Quando eu cheguei no hotel, o M. já estava lá e saímos para almoçar. Até aí, tudo tranquilo. Percebi que ele tinha uns papos filosóficos demais para o meu gosto, mas nem dei muita bola para isso. Voltamos para o hotel, nos trocamos, deixamos um bilhete para a C., avisando que quando ela chegasse, ela deveria nos procurar na praia.
Fomos para a praia e lá ficamos muitas horas. Talvez tenha sido só 15 minutos, mas o papo do cara era tão chato que para mim pareceu que foram várias horas. Por sorte, ele já tinha feito amizade com um argentino pela internet e não sei como, esse argentino nos achou lá na praia. As coisas melhoraram bastante depois do encontro com o argentino, porque o inglês dele não era bom e o nosso espanhol era péssimo, então a gente se comunicava num portunhol bem básico.
Aí a C. chegou. Foi empatia à primeira vista. Ficamos um tempão na praia, saímos para ver o pôr do sol, voltamos para o hotel, nos arrumamos e saímos para jantar.
O meu santo não tinha batido com o dele e isso já era fato, mas não tinha o que fazer. O hotel já estava pago, a ilha estava lotada e eu teria que ficar três dias aturando o cara. Saíam faíscas a toda hora, até porque meu gênio é bem forte, mas nós dois fazíamos um esforço para manter a cordialidade.
E enfim, chegou o grande dia da virada. Na noite do réveillon, nós já tínhamos feito outros amigos na ilha. O M. estava bem amigo de um outro brasileiro que conhecemos por lá e eu estava bem amiga da C. De qualquer maneira, fomos todos juntos para a praia e a ideia era que a gente não se separasse, porque só tínhamos uma chave do hotel e o hotel não tinha recepção. Até hoje não acredito que pagamos U$70 por aquele quarto e os caras só nos deram uma chave, mas tudo bem. Eu tive um pressentimento que em algum momento, essa história da chave iria causar algum tipo de transtorno e de fato causou.
Eu bem que tentei ficar com a chave, mas meu vestido não tinha bolso, o da C. também não e o M. se ofereceu para guardar a chave na bermuda dele. De repente, do nada, ele simplesmente desapareceu. Como a festa estava só começando, nem nos preocupamos muito, porque talvez ele tivesse ido ao banheiro. Uns 15 minutos depois, nós vimos ele lá perto do mar, agarrado numa menina e eu lembro que nessa hora, ainda falei para a C. – “acho melhor a gente pedir a chave do quarto para ele.”
Ela concordou que era uma boa ideia, mas resolvemos ir comprar mais umas bebidas e ir até o banheiro antes de pedir a chave para ele. E quando voltamos, não conseguimos mais encontrar o M.
Como a praia nem era grande, resolvemos andar até o final para ver se a gente o encontrava. Nem seria muito difícil, afinal ele estava vestindo uma camiseta super chamativa. Rodamos a praia inteira e não encontramos o M. Voltamos para a área que seria o “ponto de encontro” da galera e sentamos numas cadeiras, na esperança que ele aparecesse em breve com a chave. Nessa altura do campeonato, metade das pessoas que estavam na praia já estavam bêbadas ou drogadas e começamos a ver umas bizarrices do tipo – casal transando no mar, pessoal fazendo sanduíche humano (trenzinho de funk em baile carioca parecia bastante inocente perto daquele sanduíche humano) e por aí vai.
Então, decidimos voltar até o hotel, pensando que talvez ele já pudesse estar lá. O hotel não tinha recepção, mas era possível chegar no corredor dos quartos sem chave. Quando chegamos quase na frente da porta do nosso quarto, encontramos um cara deitado no chão. O cara parecia ser um lutador de muay thai pelas roupas que estava vestindo.
Ele perguntou se a gente também teve problemas com a chave e a gente respondeu que sim. E a história dele era igualzinha a nossa – os amigos estavam com a chave e ele se perdeu dos amigos.
Eu falei para ele que ía tentar entrar pela sacada. Dei a volta e tentei escalar a sacada. Nem era tão perigoso, mas eu poderia me machucar se caísse. Aí ele começou a gritar e disse que ía me ajudar. O cara era bem forte, então ele me colocou no colo e me ajudou a escalar.
Quando eu cheguei na sacada, tentei abrir de um lado e estava trancada. Tentei abrir do outro e não acreditei quando vi que estava aberta. Acho que como não tínhamos aberto a sacada antes, nem percebemos que ela já estava aberta. Fiz um sinal para a C. e para o cara e disse que estava aberta. Eles também entraram pela sacada. O carinha do muay thai foi se despedindo, até que a C. disse que ele podia dormir na cama do M.
Não estava muito confortável com a situação de ter um estranho dormindo do nosso lado, mas estava tão brava com o M. e seu sumiço com a chave que concordei (eu sou uma pessoa do bem, mas quando alguém me provoca, sai de baixo).
A C. deitou e desmaiou. O cara deitou na cama do M. Ele estava muito bêbado, mas ainda tentou puxar um papo. Minha cama era a do meio e eu estava meio tensa com a situação do desconhecido dormindo do nosso lado. Não consegui dormir.
Quando amanheceu, o M. chegou. Ele levou um susto quando viu que nós estávamos dentro do quarto e ficou ainda mais assustado, quando viu um cara dormindo na cama dele. Acho que a C. nem acordou quando ele entrou, mas eu continuei fingindo que estava dormindo. Escutei ele tentando convencer o cara a ir embora, mas o inglês dele não era muito bom e o inglês do muay thai era bem difícil de entender mesmo, porque ele era do norte da Inglaterra. Nisso, o M. me acordou e falou que eu tinha que resolver a situação.
Falei que não iria resolver nada e que o problema era dele e que aquela situação só estava acontecendo, porque ele tinha sumido com a chave. Começamos um leve barraco, até que finalmente eu convenci o cara a ir embora. Voltamos a dormir.
Desnecessário comentar que o dia seguinte foi tenso, mas pelo menos faltava só mais 1 dia para a gente sair do hotel.
Lições desse episódio:
– Conhecer pessoas pela internet pode ser perigoso.
– Nunca deixe a chave do quarto do hotel sob a responsabilidade de outra pessoa.
– Não deixe um estranho dormir no seu quarto de hotel só porque ele te ajudou a escalar a sacada.
– Não é porque uma pessoa está vestindo um uniforme de muay thai que ele é de fato lutador. O inglês estava usando o uniforme como fantasia para o réveillon. Se os brasileiros tem o costume de se vestir de branco, aparentemente existem pessoas que tem o costume de se fantasiar durante a virada de ano.