Abril de 2012, Londres.
Era o meu último dia. Era o dia de voltar para casa. Casa? Que casa? Depois de tanto tempo sem lar, sem rumo, era difícil assimilar o conceito que, a partir de então, eu voltaria a dormir todas as noites na mesma cama e que teria de volta um banheiro só para mim. No meio daquele turbilhão de emoções, eu só me animava com o fato de que não precisaria mais me trocar dentro do banheiro. Tá aí uma coisa que realmente senti falta durante minha volta ao mundo: a privacidade da toalha. Digo, poder sair enrolada na toalha e me trocar com calma dentro do quarto e fazer meu ritual diário de hidratação (coisa, aliás, que praticamente não fiz durante a viagem). Cremes? Larguei o único pote que tinha no primeiro mês da viagem. Pesava demais.
Minha amiga me deu uma carona até a estação do metrô. De lá, peguei a Piccadilly Line para o Heathrow. Ah, o Heathrow! Fui direto para o balcão da TAP fazer o meu check-in. A atendente me perguntou se eu só tinha uma mochila para despachar. Respondi que sim. Era realmente o começo do fim.
Parei na Starbucks para tomar meu último Chai Latte (vício que adquiri na Austrália). Peguei logo o maior, afinal eu realmente não sabia quando veria uma Starbucks de volta (em Curitiba não tem). Quando perguntaram meu nome, eu disse Alicia. Tomei aquele chá como se fosse minha última refeição (mas não foi, porque eu encontrei umas moedas de libra e acabei comprando mais um chá e um croissant).
E fiquei ali pensando: será que tudo isso aconteceu mesmo? Eram dias especialmente difíceis para mim, principalmente depois do incidente do Líbano, mas não poderia deixar que um fato isolado estragasse o melhor ano da minha vida.
Era difícil acreditar que já tinha acabado e que não tinha sido um sonho. Eu olhava aquelas pessoas no aeroporto, aquela muvuca e lembrava de todo mundo que tinha conhecido. Cada um com a sua história, cada um a sua importância. E eu já sabia que dificilmente veria aquelas pessoas de volta, então não me restava muito a não ser lembrar de tudo que vivemos.
Quando anunciaram o embarque do meu voo para Lisboa (eu faria conexão lá), comecei a chorar. Já sabia que teria que dar adeus para aquela fase “todos os dias são sábados” e embarcar na aventura “quase todos os dias são segunda”, fase que também é chamada de vida real.
Ainda fiquei um tempo no aeroporto de Lisboa e tive mais um tempo para relembrar de como era minha vida por lá. Tempo o suficiente para pensar: por que eu estou voltando? Estava fisicamente acabada, emocionalmente arrasada e financeiramente quebrada. Isso explica (muito) porque eu entrei no voo para São Paulo.
Depois de tantos voos, aquele pareceu o mais longo. Ainda estava no piloto automático. A comissária perguntava em português, logo em seguida em inglês e eu respondia em inglês. Já não estava mais acostumada a falar português. Aliás, respondendo a curiosidade de alguns que me perguntaram – como você fazia para se comunicar com sua família? Email e facebook. Quase não usei skype durante a viagem. Fusos diversos, wi-fi que nem sempre funcionava e preguiça (confesso).
E aí, Guarulhos. Aquele soco no estômago! Desculpa, mas não tenho palavras melhores. Aquela zona e eu finalmente me dei conta: acabou! Chorei mais um pouco.
Curitiba estava ali: tão perto, tão longe. Já tinha esquecido como é ruim ter que fazer conexão em São Paulo. Aí lembrei das inúmeras cidades por que passei e que nem aeroporto tinham. É, sempre tem alguém em situação pior.
O voo pousou. O céu estava cinza (não tinha como ser diferente). Minha mãe estava lá no aeroporto me esperando. E foi tudo tão rápido que parece que nem tinha acontecido. Pareceu um sonho, mas foi muito real.